TERÇA DO DIREITO: A PROTEÇÃO A DIGNIDADE FINANCEIRA DO CONSUMIDOR

O Blog do Édipo Natan traz uma novidade para seus leitores.

A partir de agora, sempre as terças-feiras, teremos a "Terça do Direito", com o advogado Dr. Alyson Alves debatendo um tema interessante e de interesse da população.

Acompanhe acessando o Blog Édipo Natan. Confira:

A PROTEÇÃO A DIGNIDADE FINANCEIRA DO CONSUMIDOR

Há alguns dias terminei um romance de William Somerset Maugham, chamado de Servidão Humana. Bem na metade do livro o personagem Foinet dizia:

 

“Nada mais degradante do que as contínuas preocupações com os meios de subsistência. (...) O dinheiro é como que um sexto sentido, sem o qual não podemos usar de modo completo os outros cinco. Sem uma renda decente, metade das possibilidades da vida ficam perdidas para nós. O único cuidado que se deve tomar é não pagar mais de um xelim pelo xelim que se ganha”

 

Dias depois uma senhora, Dona Maria das Dores, de pouco mais de 68 anos e baixo grau de escolaridade me procurou no escritório para relatar uma aflição. Nervosa, dissera-me que de sua aposentadoria de 1 (um) salário-mínimo recebia pouco mais de R$ 360 reais.

Contara-me que fez um empréstimo de R$ 3.000,00 para realizar uma pequena reforma em sua casa, mas em nenhum momento sabia que, por conta desse empréstimo, passaria a receber R$ 360 reais.

Intrigado, pedi que me mostrasse o contrato de empréstimo, (agora vem os abusos e as ilegalidades) I) disse que não foi entregue. Pedi também que me mostrasse o extrato da conta, ao apresentar, percebi que a 2) instituição financeira houvera retido o pagamento do benéfico para outra conta bancária para fazer o desconto das parcelas do empréstimo, para depois depositar em outra conta o valor restante. Solicitei ao banco cópia do contrato 3) enviaram com 30 dias.

No contrato, o crédito de R$ 3.000,00 tomado de empréstimo fora dividido em “longas” e “suaves” 18 prestações de R$ 668,00. Em conta rápida é possível verificar que os juros cobrados foram algo em torno de 21% ao mês. A taxa média de empréstimos desse tipo gira em torno de 4 a 7 % ao mês, o que já é absurdo. Juros de cartão de crédito e cheque espacial, que são os maiores juros do mercado, não passam de 9% ao mês.

A senhora estava há 5 meses sem poder comprar a alimentação de sua casa. O restante do salário não dava nem para os remédios que ela precisa tomar, muito menos a despesa com água, luz e gás. É uma clara questão de superendividamento.

Entrou em vigor na sexta-feira, 02/07/2021, a nova lei de 14.181/21. Conhecimento como lei do superendividamento. Essa lei modifica o Código de Defesa do Consumidor (CDC), trazendo regras de prevenção e tratamento do chamado endividamento excessivo, ou superendividamento. Dentre suas diretrizes estão o crédito responsável, delegando para as financeiras a responsabilidade pela informação e gestão dos recursos do consumidor, além de concretizar diretrizes já existentes na legislação brasileira, como a garantia do mínimo existencial e da boa-fé nos contratos de crédito, além de proibir o assédio de consumo nas relações de crédito a prazo.

O art. 54-B disciplina que é de obrigação das empresas que vendem a prazo informar ao consumidor, como bancos e financiadoras, o custo efetivo total, a taxa mensal efetiva de juros e os encargos por atraso, o total de prestações e o direito de antecipar o pagamento da dívida ou parcelamento sem novos encargos. As ofertas de empréstimo ou de venda a prazo deverão informar ainda a soma total a pagar, com e sem financiamento.

O art. 54 –C ainda proíbe que a empresa de crédito veicule, ou informe ao consumidor, que suas operações não consultam os órgãos de proteção ao crédito como o SPC. Também fica proibido qualquer tipo de assédio financeiro ou pressionar o consumidor para contratar o fornecimento de produto, serviço ou crédito, principalmente se se tratar de consumidor idoso, analfabeto, doente ou em estado de vulnerabilidade agravada ou se a contratação envolver prêmio;
Como sanção, a lei prevê que os descumprimentos desses deveres acarretarão redução dos juros contratados e dos encargos, a dilação do prazo de pagamento previsto no contrato original, conforme a gravidade da conduta do fornecedor e as possibilidades financeiras do consumidor, sem prejuízo de outras sanções e de indenização por perdas e danos, patrimoniais e morais, ao consumidor.

O contrato de empréstimo celebrado por Dona Maria está em desacordo com os conceitos e diretrizes impostos pela lei. Dentre os principais vícios, estão a falta de clareza nas informações, a não entrega do contrato, juros exorbitantes e contrato excessivamente oneroso. Ao final do contrato, a contratante terá pago o dobro do valor contratato. Em 1 ano e meio de contrato lhe custará 120% de juros. O que é totalmente ilegal. Pela lei, não só tem direito a redução dos juros como caberia indenizaçao por Danos Morais.

Essa legislação é um importante avanço para a implementação do respeito e da dignidade de tantos brasileiros que sofrem, assim como Dona Maria, assédios por financeiras. Num país como o Brasil, com renda média abaixo do ideal, as instituições de crédito e de venda a prazo têm um importante papel para promover o desenvolvimento social e a aquisição de bens de consumo, desde que não haja abusos e usura no retorno legítimo oriundo dos juros.

Fornecedor e Consumidor devem atuar de maneira justa e de boa-fé. É nessa ralação equilibrada que impulsiona o desenvolvimento nacional. Afinal, há uma sentença milenar que diz que justiça é dá a cada um o que é seu de direito.

 

Alyson Alves de Lima. Advogado. Mestre em Direito. E membro do IDASF.

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